Crise ambiental é agora: Os desafios do jornalismo ambiental em Moçambique
Em tempos da democracia, a comunicação tem um papel fundamental para influenciar acções que visam a sustentabilidade do planeta. Enquanto profissional de comunicação, interrogo-me sobre o papel do jornalista diante de tamanhas incertezas sobre o futuro do planeta perante a crise ambiental: Será o de mero contador de histórias? Será compatível o papel de cidadão (democrata) participativo com o de jornalista? Não será a missão do jornalista indagar-se e indignar-se em relação a crise climática?
Historicamente, nos países ocidentais, o debate sobre as razões de ser do Jornalismo estão associadas ao pleno exercício da cidadania e, no Século XXI, a consideração da cidadania não pode mais deixar em segundo plano a questão ambiental, pois, quando falamos do meio ambiente, precisamos de ampliar o nosso olhar e ver o todo: percebermos a relação que tem com as questões sociais, culturais, políticas, económicas, históricas, entre outras.
Este campo (o meio ambiente) é complexo e deve perpassar, de modo transdisciplinar, todas as áreas do conhecimento, inclusive a da Comunicação – e do Jornalismo, seu subcampo.
Assim, no âmbito das celebrações do dia Mundial da Liberdade de Imprensa no presente ano, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e Cultura (UNESCO) ressalta a importância do Jornalismo e da liberdade de expressão no contexto da actual crise ambiental global, cujo lema é: “Uma imprensa para o planeta: o jornalismo diante da crise ambiental”.
É uma escolha acertada, tendo em conta que a crise ambiental constitui, actualmente, uma das maiores preocupações da sociedade, figurando-se nas prioridades da agenda política mundial, embora as acções decorrentes ainda sejam paliativas e não correspondam à gravidade do momento.
As mudanças climáticas constituem o exemplo mais perceptível de o que a acção humana pode provocar ao planeta e sua visibilidade dá-‐se através de vários fenómenos, tais como inundações, ciclones, secas, doenças e insegurança alimentar. Estes eventos têm mobilizado organizações não-‐governamentais (ONG’s), sociedade civil e governos a reflectir com profundidade sobre o assunto e Moçambique não é excepção.
O ensino e as pesquisas em Jornalismo Ambiental são muito recentes nos países de língua oficial portuguesa, mesmo em países com uma longa tradição em estudos de comunicação e jornalismo, como é o caso do Brasil.
Em Moçambique, a situação é ainda pior, pois, as escolas de formação superior em Comunicação e Jornalismo surgiram há aproximadamente duas décadas e a produção científica de temáticas ambientais é quase nula. Aliado a este factor, está o facto de estas entidades de formação académica não conterem no seu currículo cadeiras ou módulos sobre o Jornalismo Ambiental.
Na perspectiva de cobertura jornalística, realçe-‐se que poucos órgãos de comunicação social nacionais têm editoriais e espaços de antena específicos reservados ao meio ambiente. O tema tem sido pauta dos media quando o assunto tem a ver com catástrofes naturais e através de acções de defesa do meio ambiente levadas a cabo por organizações não-‐governamentais (ONG’s) nacionais e estrangeiras.
Com efeito, urge introduzir-‐se a disciplina de Jornalismo Ambiental nos cursos de jornalismo em Moçambique como um novo paradigma para a formação geral dos jornalistas, considerando-‐os produtores intelectuais capazes de gerar um pensamento sistémico que dê conta da dimensão educativa da profissão e da Ética do Cuidado com que deve ser exercida.
Em alguns quadrantes, a legislação estabelece que conteúdos sobre o meio ambiente (educação ambiental) sejam desenvolvidos como prática educativa integrada, continua e permanente em todos os níveis e modalidades do ensino formal, inclusive no nível universitário, em todos os seus cursos.
Outro aspecto tem a ver com a formação e actualização dos jornalistas sobre questões ambientais, de modo a garantir a produção de matérias de qualidade e completas, pois, muitas vezes, o cientificismo que as caracteriza retrai o engajamento e o compromisso dos profissionais.
Portanto, concretizados alguns dos desafios mencionados, os jornalistas serão capazes de trazer visão sistémica dos factos; dar conta da complexidade dos eventos ambientais; contemplar a diversidade dos saberes e não ser refém de fontes oficiais; defender a biodiversidade e a vida em sua plenitude, o que significa deixar de ser imparcial; assumir seu papel de educador, de cidadão e de transformador.
Nome do autor: Arsénio José Farranguane
Email: arsenio.farranguane7@gmail.com
Membro do grupo de pesquisa em Jornalismo Ambiental, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, URFGS, Brasil.
Foto: AJADH
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